21 fevereiro, 2010

Segurança no Trabalho: Uma Relíquia Para a Vida

Texto escrito há uns anos atrás e publicado na Revista "O Apicultor". Pareceu-me oportuno voltar a publicá-lo, pois nesta Primavera irá decerto haver muita avidez pela captura de enxames, para repor os efectivos perdidos durante o fim do ano passado.

Uma das características da apicultura que mais “afastam” os eventuais praticantes é sem dúvida a picada das abelhas. Por obra do Criador ou da Selecção Natural, os laboriosos bichinhos foram prendados com tais defesas que lhes permitem até afugentar os animais mais temíveis, e o Homem não constitui excepção, por vezes até com consequências muito graves.
Mas não é este o único perigo para o apicultor, aliás a lista de possíveis azares é, infelizmente, muito extensa. E reporto-me a todo um rol de acidentes que pode ocorrer no transporte de colmeias e outras cargas apícolas, as dificuldades de acesso dos serviços de emergência aos locais onde estão instalados os apiários, nas melarias os objectos aguçados e cortantes, as máquinas rotativas, e até as quedas que ocorrem durante a captura de enxames.
É mais ou menos neste quadro que se insere a história do Arlindo Nanques, novo ainda na idade mas muito experimentado já na vida apícola, tem 45 anos, e já é apicultor há mais de 20, actividade que desempenha com a maior das dedicações e carinho. Vive na Torre das Vargens – Ponte de Sor, e é um dos sócios mais activos da associação local, a Apisor.

Há cerca de sete anos, durante a Primavera e numa das frequentes visitas que fazia ao seu apiário de colmeias Práticas, encontrou um enxame pousado num Sobreiro. Um pequeno enxame, ao qual não ligou importância. Até porque este estava num local de acesso difícil, a cerca de 8 metros de altura.
Entretanto, aproxima-se um pastor, seu amigo, que lhe pediu para capturar o enxame e lho oferecer. O que se passou a seguir é fácil de prever, nesta região quase todos os apicultores têm uma escada perto do apiário, umas mais seguras outras mais improvisadas, que usam para recuperar enxames em locais mais altos. E o Arlindo lá subiu para efectuar esta tarefa, chegado à altura do enxame quebra-se o degrau onde encontrava apoiado, e vem por aí abaixo sob o olhar impotente do pastor.
Sentiu uma pancada forte na coluna, no impacto com o chão, resolveu mexer os dedos, mão braços, etc., para ver se estava tudo em ordem. Satisfeito com o resultado do teste resolveu levantar-se, quando sentiu uma dor forte na perna, estava quebrada muito próximo do pé.
O pastor, que assistira a tudo resolveu ajudá-lo, e quando o acidentado se preparava para tirar um canivete para cortar a bota, aquele antecipou-se e “arrancou-lha” o melhor que pode!, e vão duas! Calculem as dores que tal acto causou, apesar da boa vontade do amigo que nervoso tentou fazer o melhor possível.
De seguida, o pastor veio à povoação para que fosse chamada uma ambulância, visto que nenhum dos dois possuía telemóvel, e ainda que possuísse, posso informar-vos que a zona é pouco ou nada servida de rede.
A ambulância não tinha acesso ao acidentado, e penso que é desnecessário descrever-vos o local uma vez que todos os apicultores estão bem familiarizados com os locais onde é comum instalarem-se colmeias.
Se a montanha não vai a Maomé, vai o Arlindo à ambulância, numa maca improvisada para o efeito, e nada melhor do que a escada de onde se precipitou, com uns ramos de Esteva e Rosmaninho para dar mais conforto e amparar a perna. E vão três !
Já na ambulância surge nova surpresa, esta ficou atolada num ribeiro sazonal cheio de água na Primavera. Chamou-se um tractorista, com o respectivo tractor, e à custa de uns puxões violentos acompanhados dos respectivos solavancos da ambulância e dos gritos do Arlindo lá se superou mais uma etapa. E vão quatro !
A deslocação Ponte de Sor – Abrantes, foi feita a passo de caracol, não houvesse complicações para a coluna, e dados os antecedentes desta “aventura” seria muito fácil.
Chegado a Abrantes, à espera de ser operado de urgência, ainda teve que esperar pelo dia seguinte porque tinha havido um grande acidente na região e com feridos prioritários, e vão cinco !
Resultado, várias fracturas expostas, mais de um ano com placas de metal, gesso, parafusos, dores horríveis sempre que o tempo muda e dificuldades permanentes na locomoção – uma relíquia para o resto da vida!
Quero com esta “história verídica” um pouco de reflexão da parte de todos, sempre que se dirijam para o apiário ou para a melaria. Devemo-nos recordar e praticar todas as normas de segurança e sobretudo cumprir uma regra de ouro: nunca ir visitar as colmeias sem levar pelo menos um acompanhante.

9 comentários:

Mário disse...

Trágica historia, a qual espero que o Sr. Arlindo tenha as melhores e francas recuperações.
Realmente parece obra do diabo, como se não bastasse o primeiro azar.

Mestre,essas recomendações de cuidado são sempre triviais, embora por vezes esquecidas (falo por mim).

Abraços
Ferradela

Alien disse...

Viva Mário,
Uma vez (estava eu a "colher" um enxame num sobreiro), partiu-se um degrau da escada e levei um "banho" de abelhas. Ri-me, claro, mas podia não ter rido...
e histórias destas conheço várias

Abraços
JPifano

Meliponário do Sertão disse...

Não sou apicultor caros amigos, mas de certo modo já passei alguns sufocos com as Minhas abelhas sem ferrão, certa vez quando estava capturando uma colônia de abelhas bem pequenas (plebeias) e estava a passá-la para uma caixa racional uma delas inventou de adentrar em meu ouvido... Nunca na minha vida tinha sofrido dor tão enlouquecedora...

Fui parar no Hospital para que fosse removido com uma pinça, e o pior não foi isso, o pior foi esperar 2 horas pelo médico com abelhas ainda viva sem querer sair.

Agora estou a rir mas na hora garanto que um grande desespero.

Depois disso passei a usar protetores nos ouvidos durante o manejo.

Kalhil
Mossoró-RN
Brasil
www.meliponariodosertao.blogspot.com

Apisarte disse...

Pedi eu uma tarde de férias e saí do trabalho para manipular uma colmeia deveras agressiva! Tudo correu bem até ao final, só que para cúmulo dos azares apareceu o homem da TVCabo e não quis um fato porque percebia de abelhas e não tinha medo!
Não seguiu as recomendações e acabou por levar uma ferradela dentro de uma das narinas! Acabei por as levar para bem longe para não mais ter problemas!

Mário disse...

Sem fugir ao tema original, nem descaracterizar a situação, amigo Apisarte, se o técnico era da tvcabo era deixa-lo levar umas valentes ferradelas, eu por mim não me importava nada lol.

Abraço

octávio disse...

Texto escrito há uns anos atrás e publicado na Revista "O Apicultor". Começou assim este texto, aliás deveras previdente para a época que se avizinha.

Fora deste contexto, mas muito interessante, hoje folheava o último número do mensário, "CRISOPA" e eis que na página 10 me deparo com o ilustre Mestre Pífano, a relatar a sua descoberta dos tradicionais cortiços de corpela do Gerês, aliás minuciosamente descrita a forma da sua confecção na, também, revista do apicultor, ilustrada com fotos e esquemas elucidativos.

Parabéns Mestre Pífano, pela sua força, a sua persistência em prol de dar a conhecer às várias sensibilidades e, por vários meios o património, no caso vertente, o património apícola, dos nossos antepassados, muitos nossos familiares, que com muito carinho temos na memória.

Um muito, muito Obrigado,

Octávio

Alien disse...

Caros amigos,

De facto sinto que a "ressaca" do fim do ano está a passar e lentamente, o Montedomel está outra vez a "zumbir"...
Obrigado a todos pela força e... pela paciência
JPifano

AnaPCarvalho disse...

Isso é que é falar! Fico feliz pelo Montedemel a reflorir com a primavera que já anda por ai!
Um beijinho

octávio disse...

Bom! a ressaca de fim de ano do Mestre a passar;
A Primavera a aproximar-se (pelo menos no calendário);
Vou assinar o aludido mensário na expectativa de mais artigos do autor deste blogue.
Falta só o empenho do meu conterrâneo, Mário (que ainda não tive o prazer de o conhecer pessoalmente) não ter conseguido arranjar-me, não um monte, não uma quinta mas tão só um quintalito para eu ter as minhas meninas e umas plantitas perto de mim. Ficou a intenção, que muito me agradou e continua a expectativa e, claro a procura da nossa parte (eu e Ana).
Venha daí essa energia Mestre Pífano.
Tem aqui uns atentos seguidores, muitos que conheci graças aos fóruns.
Forte Abraço para todos,
Octávio,