26 maio, 2010

A Arquitectura das Abelhas

Ora aí está mais uma que vai dar falatório…
Primeira visita ao apiário de um “recém-apicultor” muito entusiasta, quase noite, ainda assim com luz suficiente para registar uns quantos fenómenos dignos do Entroncamento. Desde quadros com arame zincado de 2 mm de diâmetro para segurar a cera a outras novidades que um dia havemos de debater…
Mas o mais enigmático ainda estava para vir.
Abrimos uma colmeia, enxame recente, a falta de um quadro e um pequeno favo (10 x 15 cm) pendurado da prancheta nesse local, uma pequena “seta”, como já lhe tenho ouvido chamar. Até aqui tudo muito normal. Retiramos o favo para colocar um quadro nesse sítio e à luz da lanterna resolvi inspeccioná-lo para ver se já havia postura.
Foi quando me ocorreu que no excelente workshop sobre as ceras, apresentado pelo Ruben e Francisco Rogão, no segundo aniversário do Forumeiros em Seia, houve uma conversa relacionada com a posição dos alvéolos.

Um dos participantes disse-me qualquer coisa relacionada com a colocação das lâminas de cera na colmeia, onde metade dos quadros deviam ficar com os (YY) virados para cima e os restantes cinco com os (YY) virados para baixo:

Os (YY) são os “desenhos” que observamos dentro de cada hexágono da cera moldada e que correspondem às paredes de três hexágonos do lado oposto. Ou seja, se os rolos de moldagem de cera estiverem alinhados correctamente, a cada hexágono (que originará um alvéolo) corresponde do lado oposto à união de três outros hexágonos.
Isto acontece em condições naturais, nos favos construídos exclusivamente pelas abelhas. Tal “desencontro” nas paredes do fundo dos alvéolos faz com que estas estruturas sejam muito mais resistentes:

No esquema anterior, como podem observar, os (YY) (a branco) e referentes ao verso da lâmina de cera, estão virados para baixo. Ou eu não a percebi bem ou esta “teoria” é no mínimo muito estranha, pois se olharmos para a lâmina de cera pelo lado oposto reparamos que os (YY) estão virados para cima… depende portanto do lado que se olha e sem rodar a lâmina…
Se fizermos uma rotação de 180º à lâmina de cera os (YY) ficam virados para cima e isso não altera nada a posição correcta (natural) dos favos. Ou seja, cada hexágono deverá ficar com um vértice para cima e outro para baixo:

O que não seria nada natural seria uma rotação de 90º na lâmina, fazendo com que os hexágonos ficassem com dois vértices opostos na horizontal:

Ora tal situação nunca se verifica, a não ser que a cera tenha sido mal cortada…
Veja-se na imagem seguinte a lâmina na posição natural e na posição incorrecta:

Estava eu nestes pensamentos enquanto observava o dito favo a contraluz, e qualquer coisa me chamou a atenção no padrão criado pelos alvéolos:

Como podem ver na imagem anterior (desfocada), surge-nos um padrão que se repete e que lembra “flores” de seis pétalas desenhadas pelos alvéolos.
Nunca tinha visto nada assim…

FACTO: Numa observação mais atenta consegui perceber que os alvéolos de um dos lados do favo se encontravam na posição correcta (natural) e no outro lado com os hexágonos de vértices na horizontal:

As imagens anteriores referem-se ao mesmo favo (dos dois lados) e em condições diferentes de luminosidade e inclinação para que se perceba a diferença.
Reparem que cada “flor de seis pétalas” tem como centro (ou botão) o “encontro geométrico” ou justaposição de dois alvéolos de ambos os lados do favo, o que nunca sucede em condições naturais:

Mais ampliado:

Agora esquematicamente:

Mesmo nesta simulação teórica se conseguiu o mesmo padrão, pelo facto de haver uma rotação de 90º entre os alvéolos de um lado do favo (posição natural) e os do outro lado (posição anómala).

O que “passaria pela cabeça” destas abelhas quando resolveram alterar completamente o padrão habitual de construção dos alvéolos de cera?
Ainda por cima fazendo-o apenas num dos lados do favo, uma vez que do outro se encontram na posição natural…

Regressava a casa e pensava em tudo isto sem lhe encontrar qualquer solução. Não imagino que estímulo natural ou artificial possa ter induzido as abelhas a alterar completamente um dos seus comportamentos básicos. E não havia qualquer anomalia a condicionar a construção do favo. E se houvesse? Faziam-no apenas numa das faces ???
Mistério!!!
Entretanto lembrei-me de uma aula de Ecologia, dos tempos de Escola Secundária, qualquer coisa sobre o efeito das drogas, produtos químicos e substâncias relacionadas. Tratava-se de uma imagem muito apelativa com uma teia de aranha, cuja arquitectura tinha um desenho impecável.
Os investigadores destruíram a teia e a aranha reconstruiu-a exactamente igual à primeira, como as imagens comprovavam. Voltaram a destrui-la mas desta vez administraram qualquer substância tóxica ao “bichinho”.
Ela voltou a tecer a sua armadilha, desta vez com um resultado menos perfeito.
Repetiram a experiência umas quantas vezes e a teia era refeita cada vez com mais imperfeições, à medida que aumentavam a dose de drogas na aranha. Finalmente, na última imagem dessa lição, surgia-nos uma teia de aranha com dois ou três fiapos de seda entrelaçados que lembravam vagamente a teia original. Como legenda uma elucidativa mensagem que dizia que para tais dosagens de químicos tóxicos a teia de aranha era completamente disfuncional, não poderia capturar qualquer presa e a aranha não sobreviveria…
Pensem o que quiserem, eu não conclui nada… ou será que conclui ???

6 comentários:

sergio_apic disse...

O que um pequeno e "simples" favo pode dar que falar.... Apicultura é isto, uma ciência sem fim.

Mário disse...

Bem amigo Pífano, está aí um mistério daqueles lol, na volta as abelhas foram para plantas que não deviam lol.
Aparte disso, já tinha constatado e tenho vindo a faze-lo, a colocação de 5 quadros com a (Y) para cada lado, é moroso e por vezes troca-nos as voltas quando da substituição das ceras no ninho, mas a verdade é generosa, e sinto que as abelhas estão bem mais confortáveis e não tão a (toa), tenta fazer a experiência em duas colmeias, depois verás.

Abraço
Ferradela

Anónimo disse...

video da aranha e os testes com varias drogas: http://www.youtube.com/watch?v=sHzdsFiBbFc

Abraço
VDF

AnaPCarvalho disse...

fico sempre fascinada pelos favos das abelhas! são lindos e misteriosos!
foi-me dito por apicultores experientes que na colocação de quadros deviamos ter em atenção que o "Y" ficava para a "madeira", e embora eu procure fazer isso, a certa altura e quando já estou cansada fico distraida pelos "Ys"...

Vou ler e reler este "post" pq acho-o muito interessante! e as fotos lindas e os desenhos muito elucidativos
Bjs Ana

Abelha Preguiçosa disse...

Para mim a dificuldade da teoria dos 'Y' está em saber onde é o centro do enxame e como proceder à medida que o enxame aumenta.

Mas quanto ao desenho do favo estou pasmado a olhar e sem palavras...
...isso não seria do combustível do Fumigador?

Apisarte disse...

Faço a centragem dos favos de um dos lados do ninho e obrigo a maioria das abelhas produtoras e construtoras das ceras a concentrarem os seus esforços num só sector e expandirem-se num só sentido! As abelhas constroem o “Y” ligeiramente inclinado.
Quando coloco a cera estampada, escrevo ou marco com tinta, no lado da travessa superior que leva o Y! O resto está naquilo que por vezes a nossa mente quer ver e muitas vezes as nossas soluções, para um falso problema, só trazem complicações ás abelhas! O quer dizer de favos de união entre ceras? Quando a cera está unida em cima e a união em baixo das ceras, na maioria das vezes não bate certo. Cumprimentos