Imagem: Abelhas "apoisadas" à entrada do cortiço
Como o sector tem tido poucos encantos, e anda tudo embrulhado nos meandros desse labirinto que é o programa apícola, vou deixar-vos uma história curiosa que transcrevi da obra “Um Povo Miúdo – As Abelhas” do conhecido Agrónomo Eduardo Sousa de Almeida e editado há 50 anos, em Novembro de 1958.
RITUAL DOS ABELHEIROS
“ (...) Usam um cerimonial de estranhas práticas, em que se adivinham interessantes tradições muito antigas, à mistura com superstições e muita ignorância.
Ainda hoje, e principalmente nas províncias do Norte do país, a apanha de um enxame faz-se segundo os ritos de uma velha tradição em que há muito pitoresco, que apesar do progresso, se tem mantido.
Logo que o abelheiro verifique que as abelhas de um dos seus cortiços estão prestes a enxamear, (...) corre a “temperar” um cortiço vazio e limpo. Este “tempero” consiste em esfregar o interior com uma erva aromática, tomilho, funcho ou erva cidreira, e borrifá-lo com vinho branco e mel, ou defumá-lo com alecrim ou incenso queimado.”
Só aqui já havia pano para mangas ...
“Ao mesmo tempo (...) expede avisos para mobilizar auxiliares. Em geral não lhe faltam voluntários recrutados entre os garotos da vizinhança.
(...) de todos os pontos do povoado aparecem auxiliares munidos dos instrumentos de ocasião, panelas e tachos velhos, latas de gasolina, foices, barras de ferro, (...) tudo o que é susceptível de fazer barulho quando batido por pau ou pedra.
Reunido o pessoal, mestre abelheiro dispõe as gentes com a importância de um general a colocar as suas forças em véspera de batalha campal.
(...) no ar levanta-se uma nuvem escura e movediça (...) o mestre abelheiro grita:
- Toca, Toca, agora com força!
Começa então a mais extraordinária cacofonia que jamais ouvidos humanos suportaram.
Pousa! Pousa! Pousa!
Pousa ! Abelha – Mestra!
Pousa! Pousa! Pousa!
(...) mestre abelheiro dá saltos de braços erguidos, vai atirando-lhe mão-cheias de terra, ao mesmo tempo que grita, rubro, quase sem fôlego:
Apoisa! Apoisa! Apoisa!
Oh! Mãe, apoisa!
Apoisa! Apoisa! Apoisa!
Apoisa, ó, Mãe!
Todo o rancho corre atrás dele repetindo o estribilho (...) _ Mais força rapazes! Ele vai pousar!
Apoisa! Ó Mãe! Apoisa!
_ Alto! Agora só com a boca e devagarinho. Vá, todos certos! Certos! Certos!
Atenção, ainda estamos falar de apicultura...
Casa Nova, Abelha-Mestra!
Apoisa! Apoisa! Apoisa!
(...) o enxame vai pousando e formando um enorme cacho castanho, (...) _ Alto lá! Caluda! Agora todos quietos e calados!
Mestre abelheiro corre a pegar no cortiço (...) começa a bater nas paredes exteriores com os nós dos dedos enquanto cantarola a seguinte melopeia:
Casa Nova, Abelha-Mestra!
Casa Nova, Abelha-Mestra!
Casa Nova, Casa Nova!
Casa Nova, Abelha Mestra!
As abelhas a princípio hesitam, (...) Algumas entram, (...) até que passa a Mestra e então é que uma multidão entra apressadamente na casa nova.”