09 novembro, 2011

Apicultura na Amazónia II

Puraquequara - Manaus - Amazónia, 18 de Setembro de 2011

Os associados da ACAM, Associação de Criadores de Abelhas de Manaus, têm por hábito a reunião mensal para o debate de assuntos relacionados com a apicultura, tal como para a prática de determinadas tarefas do maneio apícola.
Foi a melhor forma encontrada para manter o espírito associativo e ao mesmo tempo permitir que os mais experientes possam ajudar à formação dos apicultores mais recentes. Era muito agradável observar o cuidado com que cada tarefa era executada, como nenhum pormenor foi deixado ao acaso.

No dia da minha visita coube-me a sorte de poder assistir e participar num dos aspectos que mais me fascinaram das consultas que fiz aos blogs da especialidade: a transferência de abelhas de um cortiço para uma colmeia mais evoluida. Não podia deixar de ser sensível ao paralelismo com a Apis mellifera, obviamente que não se tratava de um verdadeiro “cortiço” de cortiça, mas entenda-se por tal uma colmeia sem qualquer divisão entre a zona da criação e dos melários.

Segundo o Mestre Vidarico Nascimento, que supervisionou tal prática, essas colmeias continuam a ter alguma expressão no Brasil, sendo notória a tendência para a sua troca por colmeias racionais. Estas últimas onde já podemos diferenciar uma compartimentação do espaço em ninho, sobreninho, alçam e pasmem-se: até uma lixeira na parte inferior!

Tal compartimentação acaba por facilitar inúmeros aspectos do maneio apícola, nomeadamente a multiplicação de colónias sem danos nos discos de criação. Actividade que acaba por ser de tal forma célere e até cómoda pelo facto de dispensar equipamentos de inspecção de colmeias, como os necessários no género Apis, e sem a necessidade de deslocação ao apiário, visto que podemos criar os Meliponíneos junto à própria casa.

A primeira etapa resumiu-se à limpeza externa do “cortiço”, e os cuidados higiénicos acabaram por ser uma constante ao longo de todo o processo.
Logo de seguida essa caixa foi parcialmente desmontada para um melhor acesso às estruturas internas, nomeadamente aos discos de cria, que concentravam a maioria das atenções, aos potes de mel e às próprias abelhas.

Começamos então por desembaraçar os discos de criação, vulgo alvéolos com ovos e larvas que no caso destes Meliponíneos se encontram sobrepostos e não lateralmente como na Apis mellífera, de uma série de membranas de protecção confeccionadas pelas abelhas com cera e própolis.

Uma vez libertos os discos, foram cuidadosamente destacados das paredes do “cortiço” e colocados no ninho da colmeia. Daqui ressalta uma observação curiosa: como a colónia que operávamos se encontrava muito desenvolvida, uma “pilha” de discos de criação muito alta, ultrapassando a altura do ninho, o orifício no fundo do sobreninho permite que este assente sobre o ninho sem moléstia para a criação.





Surpreendeu-me bastante, após esta etapa, o facto de terem colocado as membranas de cera que antes protegiam os discos de criação na nova colmeia, sinal inequívoco que estas abelhas se prestam à reciclagem dos seus materiais. Nada se perdeu.

Seguia-se agora a recuperação do mel, verdadeiro “assalto” aos inúmeros potes que rodeavam os discos de criação. Mel esse que mais tarde seria novamente ministrado em alimentadores internos na nova colmeia.

Os potes, do tamanho de um dedo polegar, um tanto mais grossos, armazenam mais de 10 ml de mel que é extraído com a ajuda de uma seringa e colocado em pequenas vasilhas. Trata-se de um mel com mais fluidez que o mel de Apis que conhecemos. Tal acréscimo de humidade poderá dever-se não sei se à biologia da própria abelha se às condições climatéricas da região, cuja humidade atmosférica facilmente chega aos 90%.

Certo é que também o provei noutra região muito seca e as características eram muito semelhantes. O próprio mel da Apis mellífera que me foi dado a provar na Amazónia era também ele muito menos viscoso que o que estamos habituados na Europa. Um denominador comum ao mel das Apis e Meliponíneos: ambos eram excelentes, um doce muito delicado e com notas ácidas que decerto haviam de angariar imensos apreciadores nas nossas latitudes.

Alem do mel, também encontramos potes cheios de pólen, ou de pão de abelha como lhe queiram chamar. Não calculam o sorriso de alegria quando vi a facilidade com que se podia extrair tão apreciado produto, ao contrário da extrema dificuldade em obtê-lo dos favos de Apis mellifera. Logo se foi o sorriso quando percebi que tal pólen, nos Meliponíneos, é armazenado em avançado estado de fermentação e com um sabor forte a vinagre. Será sem dúvida um excelente alimento, mas... para as abelhas.

A transferência das abelhas para a nova caixa é que me “arrasou”: capturávamo-las à mão, sem luvas ou outra qualquer protecção e colocávamo-las na nova locação. Nem a “coisa” se realizava sem que eu pusesse as mãos na massa, onde confesso que inicialmente me deixou algo confundido e logo desde a primeira captura estive sempre à espera da dita ferroada que não chegou a acontecer, evidentemente...

Talvez me arrisque a escrever a maior futilidade do mundo, mas não calculam a impressão que causa carregar abelhas com as mãos nuas. Por mais experimentado que um apicultor esteja relativamente a cada assunto, apesar das toneladas de colmeias que já carreguei em transumância... nunca tinha assim levado abelhas nas mãos nuas...

A abelha rainha (rainha fisiogástrica).

Tanto Vidarico Nascimento como Aldenora Lima informaram-nos da existência de um aspirador específico para o efeito, que permite recolher as abelhas num recipiente e depositá-las depois na colmeia definitiva. Mas como este não estava presente, usamos as mãos e foi formidável.

Uma vez transferidas as abelhas, a criação e os favos, os diversos componentes de cada colmeia foram fixos por fita adesiva, ninho e sobreninho, até que as abelhas os fixassem com segurança.

A colmeia racional foi então levada para um terraço no andar superior, para um Meliponário aí instalado e com acesso directo à vegetação do quintal. Nova surpresa se seguiu, nomeadamente a suspensão da colmeia por uma corda, ficando assim pendurada.

Num ápice, todas as abelhas que andavam no campo quando retiramos a colmeia velha, o “cortiço” e que até então aguardavam numa caixa aí colocada, se apressaram a juntar-se ao resto da colónia.

Para mim foi mais uma experiência que vou recordar para sempre, o meu obrigado uma vez mais aos associados da ACAM.

5 comentários:

Anónimo disse...

Absolutamente fantástico !
Inimaginável no nosso país.
Abelhasah.

octávio disse...

Bonito exemplo: reuniões periódicas de apicultores da mesma associação. Em Portugal tal feito é "impossível"...

Ozorio Gonçalves Junior disse...

É impressionante como estas melíponas estão amplamente distribuídas por todo território brasileiro, estou a milhares de quilômetros de distancia da região mostrada nas fotos, mais precisamente em Praia Grande litoral sul de SP, e encontro semanalmente estes meliponíneos.Em terrenos abandonados e no sítio onde mantenho minhas Apis sp.
Em breve visitem meu blog que postarei as fotos das abelhinhs sem ferrão daqui, http://duzoo.blogspot.com/

Alien disse...

Olá Ozorio,

Já visitei o seu blog que me pareceu muito interessante, vamos aguardar novas notícias do Sul do Brasil.
Já fiz o link para o DUZOO na barra lateral do montedomel!!!

Abraços
Joaquim Pifano

António Sérgio disse...

Bonito. Mas tou curioso com as africanizadas.