27 janeiro, 2014

Voando Sobre um Ninho de Abelharucos


Dos atrasos crónicos e galopantes que sempre afectaram o programa apícola nacional…

Perto do fim do ano de 2013 a ADERAVIS voltou a questionar pela enésima vez as entidades gestoras do Programa Apícola Nacional, acerca do atraso na publicação do respectivo Despacho Normativo e evidentemente sobre o período de apresentação das candidaturas.

Desta vez, surpreendentemente, responderam-nos com uma missiva longa onde se procuravam justificar os atrasos com as alegadas melhorias que neste novo diploma marcariam a diferença.

Chega a transparecer alguma boa vontade, no meio de toda aquela retórica e desculpas que já conhecíamos. Eis senão quando a dada altura nos deparamos com esta pérola, um parágrafo que de tão insólito chega a parecer surreal:

 “Salientamos que esta situação não é inédita, pois nos Programas anteriores, as datas da apresentação das candidaturas no ano inicial do programa foram: 19 de Abril de 2008 (PAN 2008 – 2010) e 24 de Novembro de 2010 (PAN 2010 – 2013), ambas após o início das respectivas campanhas (1 de Setembro de 2007 e de 2009, respectivamente), pelo que o presente programa está a seguir um calendário adequado à necessidade de preparação e definição quer de medidas quer de operacionalização, que procura sempre melhorar o que sucedeu no programa anterior, que vai promover uma profunda alteração do modelo de gestão, que irá certamente simplificar e agilizar a sua aplicação aos beneficiários, e que mesmo assim está em prazos muito de acordo com o que se registou em programas anteriores.

Tal argumentação (que chega a ser hilariante senão ridícula) não só assume a irresponsabilidade por mais um vergonhoso atraso, com todas as consequências que dele advêm, como ainda faz gala em as acentuar. Apelar à nossa tranquilidade pelo facto destes atrasos não serem inéditos é o equivalente tragicómico de uma criança que chega a casa tranquilizando o encarregado de educação com mais uma negativa a matemática porque até já está chumbado a português e foi expulso da disciplina de história.

E com isto estavam “abertas as hostilidades” para mais um programa apícola enviesado, cujo conteúdo mais uma vez parece feito à medida de determinados grupos e entidades. O refinamento face aos diplomas anteriores é de tal ordem que são cada vez menos as associações, apicultores e técnicos satisfeitos com o resultado.

Das avantajadas colheitas na árvore das patacas em Bruxelas à devolução forçada via troika…

2.444.044 Euros destinados à apicultura nacional para 2014, 7.330.038 Euros para o triénio, números equivalentes nos anos anteriores. Mais umas quantas dezenas de milhões de euros para os projectos apícolas do ProDer, entre prémios de instalação e subvenções na aquisição de equipamentos. Noutros tempos eram os projectos Agris e Agros que também financiaram este sector. Somam-se as centenas (milhares?) de formações de apicultura, apoios pontuais ao sector e tantas outras ajudas.

Se perguntarem a um europeu do Norte ele jurará a pés juntos que os apicultores portugueses utilizam colmeias em ouro, e que a curto prazo Portugal irá inundar os mercados internacionais com o melhor mel do mundo. Se visitarmos as explorações e atendermos às estatísticas, à profissionalização do sector, às médias de produção, exportações, etc, a realidade é bem diferente.

Quem beneficia afinal com esta árvore das patacas plantada em Bruxelas?

Da burocracia, legitimidade e confiança entre as entidades oficiais e associações de apicultores…

Por imposição do PAN, todos os anos as associações de apicultores reúnem em Assembleia Geral para darem à respectiva Direcção o aval para que efectuem as candidaturas ao referido programa. Lembro que a Assembleia Geral, enquanto órgão deliberativo democraticamente eleito tem toda a legitimidade para tais decisões. Neste ano de 2014, ou tal legitimidade foi diminuída ou o nível de confiança das entidades gestoras do PAN nas associações de apicultores sofreu novo abalo: todos os apicultores devem assinar uma declaração pessoal a dar o aval à realização da candidatura ao PAN, uma para a assistência técnica e outra para o medicamento. O mesmo aval que já tinham dado colectivamente em Assembleia Geral.

Eu não quero ser exagerado mas acredito que a curto prazo (até porque já não há muito mais para dificultar e complicar) essa declaração deverá ser acompanhada de um relatório de avaliação mental, prova de vida e registo criminal do apicultor, tal não é a desconfiança de que somos alvos.

Devo lembrar que no dia das eleições, com uma cruz singela num papel, avalizamos e legitimamos um chefe de governo, ministros, secretários de estado, chefes de gabinete, directores gerais, directores regionais, chefes de serviço, chefes de secção, acessores, secretários, motoristas e todo um rol de sugadores de fundos sem exigir sequer uma vulgar cópia de um Bilhete de Identidade.

Talvez seja pela nossa tamanha ingenuidade e demais provas de insensatez que essas mesmas entidades tutelares procurem certificar-se das nossas boas intenções e propósitos…

E isto dava um belo fim à história, mas há mais, na apicultura infelizmente há sempre mais:

Da harmonia, boa vizinhança, espírito de corpo e demais solidariedades entre associações…

No actual Programa Apícola foi introduzido um pormenor digno de louvor: a preocupação de só atribuir um segundo técnico a uma associação quando todas as outras já tivessem um. Há muito que ansiávamos por esta regra, sobretudo as associações pequenas, fazendo tal todo o sentido.

Mas a emenda parece estar a ser muito pior que o soneto, tal medida pouco mais está a conseguir que algumas das associações “politécnicas” enveredassem por autênticos raides de assédio aos apicultores não associados (que até ver têm esse direito) e como se não bastasse, também aos associados noutras organizações. Já vários apicultores se nos queixaram deste novo fenómeno. Já ouvimos inclusivamente falar em ameaças, coacções, denúncias e demais pressões sobre quem não assinar as “petições” a favor desta ou daquela associação.

É compreensível a necessidade que cada técnico tem em manter o emprego, tal como a da associação em manter os técnicos, mas a continuar assim quase que seria preferível a bandalha anterior, com estas perseguições, autênticos contar de espingardas, os apicultores começam a desconfiar de qualquer tentativa de organização.

Da redacção e interpretação do Despacho Normativo…

Não sei quem redige os despachos normativos referentes aos programas apícolas, mas arrisco a dizer que estagiou na Torre de Babel.

Se as confusões, dúvidas e incertezas já vinham dos diplomas anteriores, a subtileza com que o escriba vai desfiando os novos pontos, artigos, alíneas, regras e anexos, é de tal elevação de espírito ou grandiloquência que ninguém entende rigorosamente nada. Se à primeira vista um parágrafo parece trazer luz sobre determinada matéria, logo à segunda há uma vírgula que nos devolve às trevas da ignorância.

Se por incúria ou desespero solicitamos que nos clarifiquem determinada duvida ou ambiguidade de interpretações, tentativa baldada, os alegados autores do despacho ou nunca estão presentes ou perdeu-se-lhes o rasto, pois nem as entidades tutelares têm uma explicação satisfatória e definitiva para o problema. O mais certo é que das duas interpretações possíveis obtenhamos uma terceira ou uma quarta, tão claras e objectivas como as primeiras.

E porque faltam documentos; e porque os prazos são apertados; e porque os formulários não estão disponíveis no site oficial; e porque… porque a beleza do Programa Apícola Nacional reside nisso mesmo.

Da ilusão de que chega para todos aos "numerus clausus" do medicamento…

Segundo o Programa Apícola Nacional, em 2013 os 16.774 apicultores registados em Portugal terão declarado 566.793 colmeias.

Todas essas colmeias poderão (ou pelo menos assim seria suposto) ser beneficiadas com a ajuda à aquisição de medicamento na Medida 2 do referido programa.

Segundo os folhetos dos laboratórios, o preço dos medicamentos este ano ronda os 3,30€ por colmeia e por tratamento. Como a dita ajuda se destina a dois tratamentos anuais por colmeia o custo fica em 2 x 3,30€ = 6,60€.

Multiplicando os 6,60€ pelas 566.793 colmeias registadas obtêm-se a bonita soma de 3.740.833,80€.
Retirando os 25% pagos pelos apicultores ficamos com 2.805.625,35€.

Apesar da quantidade de algarismos a calculadora aguenta-se, mas já o mesmo não digo da verba disponibilizada para a Medida 2: 1.200.000,00€, menos de metade da quantia necessária.

O que dizer aos apicultores que vão ficar sem medicamento? Ou mais interessante ainda: o que dizer aos apicultores que vão beneficiar desta medida? De que vale tratar menos de metade das colónias se as restantes não forem tratadas? Como é possível controlar a varroa com medidas destas?


Doutras incongruências que nos deixam perplexos face ao diploma que ora anima as hostes apícolas…

Na Medida 4 do programa apícola prevê-se a realização de análises aos produtos da colmeia, onde as análises polínicas ao mel são cruciais para a respectiva caracterização e classificação da origem floral.

Sendo as polínicas elegíveis no dito diploma, é inadmissível que nenhum dos laboratórios de referência apresentados nas listagens da DGAV (vulgo os únicos disponíveis nos formulários de candidatura, sem hipótese de optar por outros) realize tais análises. Tal equivale a dizer que as análises elegíveis, dentro das previstas no despacho, serão apenas as que esses laboratórios realizam.
                                
...

E cá ficamos, à beira-mar plantados, à espera de dias melhores, com 16.774 apicultores emPANados…

21 janeiro, 2014

Bolo de Água Mel


Receita publicada no grupo Alentejo Terra e Gente do facebook, por Graça Basílio.

Bolo de Água Mel
O bolo de Água Mel é uma receita tradicional do Alentejo que, com o seu aroma, cor, sabor e textura húmida que arrebata os nossos sentidos.
Esta receita esteve durante muito tempo praticamente confinada ao saber das gentes dos meios rurais do Sul de Portugal e dos apicultores. A água mel, com o seu aroma e paladar únicos, mais escura do que o mel e com um sabor mais intenso, está na base de confecção deste bolo, que era feito tradicionalmente em dias de festa.
O bolo fica muito fofo e com a massa escura, podendo ser servido simples ou regado com água mel, que o deixa ainda mais húmido e apetitoso.

Ingredientes:
1 chávena de água mel
1 chávena de azeite
1 colher (chá) de canela
3 chávenas de açúcar
3 chávenas de farinha
1 colher (chá) de fermento
6 ovos
Raspas de 1 limão

Confecção:
Bata as gemas com o açúcar até obter um creme esbranquiçado.
Acrescente o azeite e a água mel e bata até o preparado ficar homogéneo.
Adicione a farinha e o fermento, juntando depois a canela e a raspa de limão.
Bata as claras em castelo firme e envolva-as delicadamente na massa.
Deite numa forma grande, untada e enfarinhada e leve a cozer, em forno pré-aquecido a 180ºC, cerca de 45 minutos. O interior da massa deverá ficar fofo e húmido.
Deixe o bolo arrefecer e desenforme.

Nota:
A água mel é um xarope escuro que se obtém da fervura prolongada da cera e do líquido resultante da lavagem dos utensílios com que se extrai o mel. Embora hoje seja usada para barrar pão e como produto gourmet, sobretudo como tempero de saladas, durante muitos anos foi o único mel que os apicultores pobres consumiam – pois todo aquele que era efectivamente produzido, tinha de ser vendido para garantir o sustento familiar.
Nem sempre é fácil de encontrar à venda, a não ser em lojas de aldeia (sobretudo nas zonas onde se produz mel), casas de produtos artesanais e lojas da especialidade ou espaços gourmet.

Saiba mais sobre a produção de água mel em:

20 janeiro, 2014

Propostas da ADERAVIS ao PAN 2014 - 2016

Propostas enviadas pela ADERAVIS ao IFAP e ao GPP, após a publicação do Despacho Normativo.
Algumas já são velhas, mas infelizmente continuam actuais...

1º O atraso na publicação Despacho Normativo que regulamenta o Programa Apícola Nacional.

Volvidos quinze anos de Programa Apícola Nacional, tanto para as associações como para os apicultores são cada vez mais difíceis de entender os motivos para os atrasos deste diploma. Situação que tanto se verifica nos anos iniciais de cada ciclo como nos subsequentes. É difícil de sustentar que um dossier que poucas ou nenhumas alterações apresenta de ano para ano (salvo o refinamento das exigências habituais e desnecessárias ou o aumento da carga burocrática) não esteja disponível em tempo útil.

Estas anomalias levam a tais atrasos, perturbações e custos acrescidos na vida das associações que muito acabam por se reflectir no desejado concretizar dos objectivos. Ficando os mesmos muito aquém do esperado e com os consequentes prejuízos para a entidade, apicultores e para o sector em geral.

Anomalias cujo primeiro prejudicado é o técnico contratado para a execução do PAN, cuja precariedade de trabalho e ausência de garantias acabam por levar ao abandono de quadros com experiência e consequente perda dessas mais-valias.

O período habitual de candidaturas ao PAN devia decorrer durante o mês de Junho, com o compromisso raramente respeitado de as associações serem notificadas da avaliação daquelas durante o mês de Novembro. Tal facto torna bastante difícil senão impossível a manutenção do técnico, na medida em que o contrato deve ser celebrado no dia 1 de Setembro quando ainda não sabemos se a candidatura foi ou não aprovada.

A ADERAVIS como a quase totalidade das associações que se candidatam ao PAN são estatutária e juridicamente sem fins lucrativos, por isso sem fontes de rendimento que lhe permitam cumprir com os deveres fiscais e sociais, além do vencimento do técnico, durante os meses em que aguardam pela aprovação/reprovação da candidatura.

Sugerimos por isso que o período de candidaturas seja antecipado, para que a resposta do IFAP nos chegue antes do final do mês de Agosto e atempadamente possamos desenvolver todas as tramitações necessárias à contratação legal e segura do técnico, tão necessário ao acompanhamento das explorações dos associados.

2º Atrasos no reembolso das associações; cooperativas; agrupamentos das despesas efectuadas nas diversas medidas do PAN.

A verba despendida pelas associações demora cerca de 6 meses ou mais a ser reembolsada pelo IFAP, o que pelas razões referidas no ponto anterior leva-nos a situações de incumprimento perante as Finanças e Segurança Social o que sempre acarreta coimas e juros de mora a somar a outros custos já insuportáveis.

Propomos que o IFAP durante o mês de Setembro adiante uma parte das verbas destinadas a cada candidatura de modo a que as associações possam cumprir com as obrigações fiscais, sociais e vencimento do técnico.

Em casos de incumprimento por parte das associações, o IFAP tem meios de recuperar a referida verba, exactamente da mesma forma que o faz nos actuais moldes do Programa Apícola Nacional, pelo que não encontramos razões para que as ditas verbas não possam ser transferidas para as associações antes das despesas efectuadas.

3º A ambiguidade de interpretações e versões de cada entidade sobre o Despacho Normativo.

Todos os anos as aparentemente subtis alterações ao programa levam a diferentes interpretações por parte das associações, técnicos, entidades oficiais e demais agentes envolvidos. As dificuldades de comunicação entre as associações e estas últimas, nomeadamente as demoradas ou ausentes respostas por parte das entidades tutelares, vulgo IFAP/GPP/DGAV causam tais perturbações e incongruências na realização das candidaturas que levam a erros ou atrasos que muitas vezes culminam na penalização parcial ou até na anulação total da ajuda.

Desde o primeiro ano de ajudas do PAN que mensalmente, ou noutras periodicidades previamente acordadas, se realizavam reuniões de coordenação entre as DRA’s e as associações da respectiva região.

Tais encontros permitiam a troca de experiência entre os técnicos de cada associação, bem como a afinação e harmonização de estratégias de apoio aos associados, beneficiando com isso todos os agentes do sector e promovendo-se outro nível de aproximação e colaboração entre as associações.

A ADERAVIS sugere que as DRA’s voltem a promover tais reuniões, em periodicidade a acordar entre esta entidade e as diversas associações da região, com todas as vantagens atrás mencionadas.


4º A obrigatoriedade da Intenção de Candidatura assinada pelos apicultores.

Esta medida, tão inédita como insólita, revela tal insensibilidade e descrédito nas organizações de apicultores que chega a parecer surrealista. Todos os anos, por imposição do PAN, os apicultores em sede de Assembleia Geral, dão à respectiva Direcção o aval para a candidatura às diversas medidas do referido programa apícola. Nunca um apicultor teve dúvidas, levantou objecções ou terá votado contra uma proposta cujas premissas pretendem as melhorias na sua exploração.

Serão as entidades oficiais sensíveis para as dificuldades que representa visitar em tempo record, dezenas, senão centenas de apicultores distribuídos por várias dezenas de freguesias e povoados, afastados muitos quilómetros e que não sendo apicultores a título principal se encontram nos lugares mais díspares onde trabalham? Onde o único contacto possível é muitas vezes o telemóvel, meio de comunicação preterido até pelos serviços oficiais por causa dos custos que isso acarreta?

Volvidos quinze anos de Programa Apícola, com tanto trabalho realizado e provas de mérito dadas, não seria possível um maior crédito e confiança nas associações; cooperativas e agrupamentos por parte das entidades oficiais?

5º A obrigatoriedade da candidatura à Medida 2, para as associações que requeiram a Medida 1-A (assistência técnica)

O nome Programa de Acções de Melhoria da Produção e Comercialização do Mel é demasiado ambicioso para que a maior parte da verba (quase 50%) seja destinado apenas à sanidade apícola e para o medicamento de uma única patologia, independentemente da sua importância.

Dado o peso orçamental desta medida, porque razão a DGAV não autoriza a comercialização de outros medicamentos, genéricos e até substâncias naturais mais baratas, permitidas na maioria dos países da União Europeia? Lembramos que o Timol, o Ácido Oxálico e o Ácido Fórmico são aconselhados para a apicultura em Modo de Produção Biológico em muitos países da UE.

Pelos mesmos motivos, porque não são contempladas alternativas aos medicamentos, como as medidas profiláticas compreendendo estrados sanitários e cera anti-varroa entre outras?

Esta promiscuidade entre candidaturas, em que cada uma obriga à outra, não faria mais sentido incluí-las numa única medida?

6º Na Medida 2, para desvios superiores a 30% entre o montante a pagar e o montante apurado, não há lugar a pagamento da ajuda.

Ao verificar-se esta situação é deveras ingrato para os apicultores que pretendem de facto adquirir o medicamento (que até pode ser a maioria) uma vez que terão de pagar o medicamento na totalidade. Com esta regra penalizam-se os apicultores que pretendem ser ajudados e não os que incumpriram.
Porque não são contemplados com a totalidade da ajuda os apicultores que pretendam adquirir o medicamento via PAN, independentemente da percentagem que o rejeita?

7º Não adaptação do Programa Apícola às diferentes realidades regionais, nomeadamente a manutenção da obrigatoriedade de candidatura à medida 2 em regiões indemnes de varroa como é o caso de algumas ilhas nos Açores.

Trata-se de mais um aspecto que revela a total insensibilidade e até desconhecimento da realidade apícola por parte das entidades que tutelam o PAN. Que sentido faz a obrigatoriedade da candidatura à medida do fármaco (para que possam ter a assistência técnica) algumas associações da região Autónoma dos Açores, cuja ilha é indemne de varroa?

8º Análises anatomopatológicas
A grande maioria dos técnicos das organizações de apicultores já tem anos de serviço e experiência suficiente para diagnosticarem a maioria senão a totalidade das moléstias e anomalias das colónias de abelhas. Não será preferível transferir parte das verbas destinadas ao medicamento e para as referidas análises na formação dos técnicos para este aspecto da sanidade? De modo que pudessem informar os apicultores em tempo útil e sobretudo com dados mais proveitosos para as explorações.

Referimo-nos ao facto de às amostras onde é diagnosticada a varroose (vulgo a moléstia mais focada pelo PAN, pelo menos em termos de peso orçamental) onde o laboratório de referência apenas informa da sua presença, informação inútil para o apicultor, sendo do conhecimento geral que todas as colmeias a possuem, quando muito mais interessava saber o grau de infecção, que determina a urgência do tratamento e que o técnico poderia aferir de imediato.

9º A negociação e aquisição do fármaco por cada associação, cooperativa ou agrupamento.

Nos últimos anos, com a aquisição e distribuição dos medicamentos acaricidas a cargo das organizações de apicultores, com todas as dificuldades inerentes a este processo, tem-se verificado um consequente desinteresse por parte dos apicultores na utilização de produtos homologados, como também um aumento dos casos de não tratamento.

Esta medida fez com que pelas diferenças de dimensão das diversas associações, o que se reflecte na capacidade de negociação de cada uma, o medicamento possa ter preços diferentes de caso para caso, prejudicando evidentemente os apicultores de associações mais pequenas onde se agrava o referido no parágrafo anterior. Qual o objectivo de promover e até acentuar estas assimetrias?

Relativamente à Medida 2, será deveras importante, senão determinante para o bom sucesso do Programa Apícola Nacional, que as negociações dos medicamentos acaricidas com os laboratórios e a respectiva distribuição pelas associações e apicultores volte a ser feita pelos serviços oficiais.

Representando a totalidade das organizações/apicultores/colmeias não terá essa entidade uma maior capacidade negocial, conseguindo preços mais competitivos, de modo que todos os apicultores beneficiem dessa medida na mesma ordem de grandeza?

Sendo a concentração da produção uma das bandeiras mais hasteadas do novo PAN, com o intuito de alcançar melhores preços, porque razão não se faz o mesmo com a aquisição do fármaco para os mesmos objectivos?

10º Obrigatoriedade dos 50% de apicultores nas formações.

A grande maioria dos apicultores nacionais pratica a apicultura como actividade marginal e complementar de outra ocupação. Tal opção leva a que a apicultura praticada não assuma as proporções e o investimento que seriam exigidas a um profissional. Por essa razão é difícil exigir a esses apicultores, a maioria, a disponibilidade para frequentar as formações exigidas pelo PAN.

Até porque os proveitos colhidos da actividade apícola, entendida nestes casos como um complemento para a economia familiar ou um passatempo, não compensam o investimento de tempo, de deslocações e outros aspectos da logística necessária para estarem presentes nos locais e datas escolhidos para o efeito. Até porque as associações sempre tiveram por hábito a descentralização e personalização destas acções em vários locais, datas e até estratégias ao longo do tempo e consoante as motivações de cada associado.

As visitas aos apiários não deixam de ser também sessões de formação. Parece-nos por isso abusivo exigir a presença de quantidades determinadas de apicultores independentemente da necessidade e proveitos que possam retirar das referidas acções. Ou pelo menos que não se penalize a associação pela não comparência desses associados, até porque sempre são envidados todos os esforços no sentido de persuadir todos a participarem.

Não esquecendo que esses mesmos pequenos apicultores aparentemente menos importantes do ponto de vista económico, são no entanto extremamente valiosos em termos ambientais, na medida em que tendo pequenas quantidades de colmeias as disseminam em lugares com menos floração, que nunca seriam ocupados pelas explorações maiores, promovendo assim a sua polinização.

11º Ordenamento Apícola

O actual surgimento de grande quantidade de novos apicultores, mercê dos projectos ProDer, com o consequente aumento exagerado do número de colmeias em determinadas regiões, requer uma coordenação e regulação mais rigorosas pelas entidades oficiais. O ordenamento apícola deverá ser respeitado, tendo em conta os recursos apícolas disponíveis em cada região e a capacidade de suporte do meio, evitando sobrecargas de colónias de abelhas e evitando o esgotamento de recursos e ou a quebra de rendimentos até níveis insustentáveis.

Pelas mesmas razões e levando a resultados ainda mais desastrosos, a entrada descontrolada de grandes quantidades de colmeias estrangeiras, com maneios e práticas muito diversos e exclusivos daqueles a que os apicultores nacionais praticam desde sempre, tem levado a um acréscimo de problemas sanitários, marcadas perdas de rendimento e até o abandono de explorações nacionais.

Não sendo estes assuntos da responsabilidade directa do Programa Apícola Nacional, mas apelando aos elevados e ambiciosos objectivos deste programa, sugeríamos que algo fosse feito no sentido de alterar a legislação relativa ao ordenamento apícola ou mesmo dotar as associações de meios para poderem actuar nas referidas situações, evidentemente que com uma colaboração mais próxima, efectiva e eficaz com a DGAV, de modo a suscitar uma intervenção mais rápida desta entidade.

As associações de apicultores são quem melhor conhece as condições no terreno e que de facto poderão ter um papel determinante na avaliação dos recursos de cada região e assim evitar que se continuem a fomentar tais concentrações de colmeias que em nada beneficiam as produções nacionais.

14 janeiro, 2014

PAN PAN Queimá Vunvú !!!

E por falar em Queimá Vunvú*, aí temos o tão ansiado PAN 2014 – 16.

A ansiedade que nos causou a sua chegada só teve paralelo na repugnância que nos causou ler o Despacho Normativo. Nem há uma semana foi publicado e as ondas de frustração, incredulidade e repulsa que transparecem nas redes sociais já sobram para fazer retroceder até um Orçamento de Estado.

Estranhas ajudas essas tão recheadas de inovação, dinheiro e boa vontade, que abrangem tanta gente e ninguém está satisfeito.

Mais estranhos ainda são os desígnios que movem mais de duas dezenas de milhares de apicultores, num país democrático, senhores das suas decisões e que estóica ou estupidamente (?) decidem sempre pela opção que mais os prejudica.

Ajudem-me a compreendê-los: então a maior parte dos apicultores não estão associados ou fazem parte de associações, agrupamentos ou cooperativas?

Nessas organizações não têm por hábito realizar com a frequência que a lei ou que as circunstâncias o exigem, assembleias-gerais, reuniões e outros tipos de encontros onde fazem chegar os respectivos anseios aos órgãos de direcção?

A maioria (senão a quase totalidade) dessas organizações não está associada numa plataforma central designada por Federação Nacional dos Apicultores de Portugal?

Não realiza essa mesma federação reuniões suficientes (e decisivas) onde as direcções das associações, cooperativas e agrupamentos devidamente mandatadas pelos respectivos apicultores associados se fazem representar?

Nas reuniões do GAPA (Grupo de Apoio ao Programa Apícola, onde a federação é um dos componentes), as reivindicações e anseios dos apicultores não chegam através de toda essa cadeia associativa?

Acredito piamente que as melhores intenções dos apicultores chegaram á direcção da respectiva associação, que por sua vez os levou à federação e que finalmente os fez ouvir no GAPA. Mas o resultado é que toda a comunidade apícola está insatisfeita, para não dizer irada.

Assumindo que não se perdeu informação pelo caminho, o mais certo é que os representantes dos apicultores, dada a eventual desproporcionalidade de forças, não consiga ou naturalmente e por outras razões maiores não possam ombrear com o IFAP/GPP/DGAV/DRAs, etc. Por isso as reivindicações/anseios dos apicultores, (vulgo legítimos beneficiários do Programa Apícola Nacional, da fama não se livram) não tiveram reflexos no referido programa.

Ou pelo menos os milhentos comentários que correm nas redes sociais, mails e demais comunicações apontam para isso.

Não levando a água ao moinho ou o barco a bom porto, seria suposto a federação protestar junto das entidades competentes, quanto mais não seja porque os legítimos beneficiários do PAN, seus representados, aparentemente em nada vão beneficiar.

Se de facto protesta, fá-lo tão discreta e silenciosamente que nada transparece para o exterior, sobretudo os resultados que os apicultores anseiam… tal como não protestam as associações nem tão pouco os associados.

O que é que falhou ao longo deste percurso?

Há poucos dias recebi um comentário no montedomel onde um dos visitantes me confessou ser um assíduo frequentador do blog, manifestando tristeza pelo facto de há muito tempo não ser actualizado. Já não tenho idade nem disponibilidade para esses luxos, mas confesso que fiquei comovido, desinteressadamente esta nova forma de comunicar acaba por criar laços entre muita gente. Tentei dar a resposta politicamente mais correcta e saiu-me qualquer coisa relacionada com a minha preguiça.

Mas a verdade, para a pessoa que fez o comentário, para quem mo perguntou pessoalmente, por mail ou outra forma qualquer, para os demais apicultores que me visitam na Web, por todo o carinho, respeito e amizade que tenho por todos, os Senhores Apicultores conseguem tirar a paciência até ao Papa Francisco! Parece não valer a pena continuar a actualizar o blog, partilhar e até incomodar os apicultores com tudo o que aqui se publica porque pouco ou nada altera o que está incorrecto. Tudo continua na mesma ano atrás de ano, o único aspecto que parece actualizado é mesmo a insatisfação dos apicultores que nada fazem para mudar o rumo das coisas.

Nem há uma ano apresentei nesse espaço as reivindicações e propostas elaboradas pela equipa técnica e demais apicultores da ADERAVIS, bem como de outras associações que connosco colaboraram:


Há cerca de um ano que a mesma equipa técnica advertiu para as injustiças relacionadas com a sanidade apícola, nomeadamente as desigualdades de direitos entre os apicultores nacionais e o resto da Europa:


Alguém ou alguma entidade envidou esforços de uma forma concertada no sentido de prevenir os problemas que se preconizavam nesses documentos e que mais cedo ou mais tarde iriam afectar TODOS os apicultores?

Alguém ou alguma entidade questionou ou de alguma forma se fez ouvir junto dos serviços oficiais no sentido de manifestar o descontentamento para as injustiças aí apontadas, assumindo que as acharam legítimas?

A ADERAVIS, enquanto entidade com personalidade jurídica e evidentemente com direitos, remeteu as questões mais pertinentes deste último documento à Direcção Geral de Alimentação e Veterinária, vulgo entidade pública paga com os impostos de todos nós e que volvido um ano ainda não recebemos qualquer resposta.

Dado o desinteresse e até o desprezo que a DGAV nos votou, informamos o Ministério da Agricultura do ocorrido, a quem colocamos as mesmas questões e com um resultado igual: sem qualquer resposta até à data e já lá vai um ano.

Face ao exposto, este é o Programa Apícola que escolhemos (ou pior ainda, que deixamos que escolhessem por nós) e por assim dizer: o Programa Apícola que merecemos, talhado à nossa medida!!!

* Queimá vunvú – expressão do dialecto forro (crioulo de S.Tomé e Príncipe) que designa aqueles que queimam as abelhas para lhes retirar o mel.

08 janeiro, 2014

Abelhas em S. Tomé e Príncipe

Mais uma aventura apícola, desta vez em terras africanas, mais precisamente em S. Tomé e Príncipe, antiga colónia portuguesa no Golfo da Guiné, a cerca de 300 km do continente africano e sobre a linha do Equador.

Clima tropical muito característico, temperaturas altas e muita humidade. Florestas densas, fechadas e vegetação luxuriante a cobrir a maior parte do território. Não foi sem surpresa que soube da existência de abelhas e “apicultores” nas ilhas, pois numa incursão anterior que fiz à Amazónia, cujas características climáticas e de vegetação se podem comparar, disseram-me que a Apis mellífera não tinha muito sucesso nessas condições por causa da densidade da floresta.

Certo é que logo nas primeiras deambulações, em plena cidade, me apercebi da abundância de abelhas nas flores dos jardins. Suponho que se trata de uma das várias subespécies africanas, apesar de ninguém mo ter confirmado nem tão pouco de qual delas se tratava.

Encontradas as abelhas seguia-se a demanda pelos apicultores, em quase todos os povoados há um ou dois, assim me informaram, mas não apareciam. Foi necessário perseverar bastante para desencantar algum e só a muito custo se assumiam como “apicultores”. Pouca conversa bastava para perceber que não eram apicultores na verdadeira asserção da palavra, pois para se ser apicultor não basta colher e comercializar o mel.

Mesmo assim e na minha ingenuidade ainda acreditei que os colectores de mel apenas recolhiam os favos sem criação, deixando a colónia mais ou menos incólume até à próxima cresta, marcando a árvore e apossando-se assim das abelhas. Erro meu, numa conversa com os autóctones apercebi-me que um deles se referia aos pretensos apicultores como “queimá vunvú” o que numa tradução livre do dialecto local quer dizer “queimador de abelhas”…

Já agora anotem esta, no dialecto forro (crioulo de S. Tomé e Príncipe) “vunvú” (ou vunvum) é abelha e “mélé” é mel!

Colónia selvagem - S. Tomé

Mais tarde, o responsável pelo Parque Natural da Ilha do Príncipe, confirmou-me os meus piores receios: as colónias selvagens eram literalmente queimadas, destruição total das abelhas, para assim retirarem o mel sem receio das picadas. Já se notavam inclusivamente os efeitos nefastos de tal actividade na polinização de cultivares e espontâneas das regiões mais afectadas.

O Parque Natural do Príncipe pretende inclusivamente levar a cabo sessões de formação para que se racionalize a prática da apicultura, de modo a que se preservem as abelhas e se mantenha a polinização de tão importante coberto vegetal.

Muitas horas de marcha, muitos quilómetros calcorreados na selva, calor, humidade, mosquitos, tempestades e até uma chuvada de grandes sementes que atingiam o solo com estrondo.
Não há nada mais agradável...

Foi precisamente na Ilha do Príncipe e após uma caminhada de muitos quilómetros pela floresta, que consegui falar com um ex colector de mel, o Zé António.

Das minhas notas de viagem:

Depois de muito o procurarmos sem sucesso, foi ele quem nos encontrou (o Zé António), alguém lhe disse que o procurávamos e veio ter connosco. Aqui as mensagens orais correm mais depressa que um sms de telemóvel.

Abelhas a aproveitar os sucos doces num caroço de manga abandonado no chão.

Foi então este ex colector de mel que me descreveu o processo de colheita e é caso para dizer que se trata de uma actividade demasiado pesada no país do “leve leve”.

Era um rapaz baixo, magro e franzino, vinha com uns calções e uma camisa cor de café com leite, falava e ria com a mesma vivacidade de um jovem de quinze anos, mas percebia-se que era mais velho, foi mesmo uma surpresa quando disse que tinha 45 anos, mais um que eu…

Há dois ou três anos que o Zé António abandonara a ocupação de recolector, mas chegava a tirar 25 litros de mel de um único enxame selvagem. Conta que essas colónias se encontravam quase sempre em árvores muito altas, a 20 – 25 metros de altura e por vezes a 30.

Para aceder à colónia e retirar o mel, o que fazia apenas de noite por causa da agressividade das abelhas, lançava uma corda sobre um ramo mais alto e içava-se por essa corda puxando uma das extremidades. Lá em cima fixava-se, protegia o rosto o melhor que podia e colocava um “fatcho” a arder sob o favo.

Esse archote, feito de folhas e cascas secas de palmeira, era passado ao longo dos enormes favos construídos no exterior da árvore, alguns com cerca de um metro, matando as abelhas que caíam cá em baixo aos milhares.
Foi uma surpresa saber que estas abelhas também constroem os ninhos ao ar livre.

A destruição das abelhas com o archote era feita com alguma ciência, evitando derreter os favos de cera, senão perdia-se todo o trabalho. Enquanto afugentava as abelhas desta forma, na base da árvore um assistente tinha-lhe preparado uma garrafa cheia de petróleo e com uma mecha a sair pelo gargalo, que era depois acesa como uma lanterna para atrair as abelhas sobreviventes para longe dos pretensos apicultores.

Nessa altura o nosso guia, o “Gila”, queixou-se, ante o riso do Zé António, dizendo que quem ficava cá em baixo era o mais sacrificado. Muitas abelhas ainda vivas caiam nesse local e picavam quem aí se encontrasse. A lanterna improvisada com a garrafa era colocada afastada do tronco da árvore, mas isso não era o suficiente.

Uma vez eliminadas as abelhas era içado um balde pela outra ponta da corda, os enormes favos (favas, como lhes chamavam) eram cortados e colocados nesse recipiente.

O balde era então descido pela corda e logo nesse local os favos eram espremidos para dentro de uma vasilha, sendo as bolas de cera abandonadas no campo, sem qualquer utilidade. Porque razão não fazem isso em casa? Com melhores condições de higiene. Não o fazem porque, segundo me explicaram, tal actividade iria atrair milhares de abelhas que poderiam picar as pessoas da comunidade.

Este tipo de actividade tende a reduzir bastante a população de abelhas da pequena ilha, sendo por isso insustentável. O Zé António pouco ou nada sabe de apicultura, limitava-se a eliminar as colónias de abelhas e a pilhar o mel, que espremia para uma vasilha no local do massacre.
E a cera? Ainda falei ao Zé António na importância que tal cera biológica poderia ter na Europa. Deixou-se rir com tal informação.

Ainda me falou numa segunda raça de abelhas, mais escuras, negras até, mas desconfio que se tratasse de alguma confusão, pelo menos não as cheguei a ver. Mais dois dedos de conversa, no total nem meia hora durou este meeting entre apicultores de realidades tão diferentes.

Esta prática não é isenta de riscos, para além das picadas na escalada a árvores muito altas e em sítios isolados e de terrenos acidentados, por vezes acontece o pior: O Zé Luís “Zé das Abelhas” com quem falei dias mais tarde, mostrou-me enorme cicatriz no rosto, fora o braço quebrado numa noite de azar. Ia mal protegido, as abelhas entraram-lhe pela roupa em grande quantidade e protagonizou uma aparatosa queda quando tentava descer à pressa. Valeu-lhe estar próximo de uma estrada, sendo por isso mais fácil o resgate, mas mesmo assim teve de ser evacuado de urgência para S. Tomé onde lhe puderam ministrar os cuidados necessários, mas ainda hoje tem mazelas.

O Zé Luís e o Rodrigues, junto à colecta de vinho de palma que as abelhas tanto apreciam e eu também.

Foi numa das deambulações pela ilha com o Zé das Abelhas que tive a oportunidade de provar o mel de S. Tomé e Príncipe, outro apicultor que vivia no local e foi buscar uma garrafa com um mel muito líquido e de cor negra. Já se devem perguntar porque razão andando eu acompanhado por um apicultor ainda não tinha provado o respectivo mel? É melhor nem perguntarem…

Despejei um pouco de mel da garrafa para a palma da mão e provei. Um mel agradável de aroma e sabor muito forte, decerto que seria muito apreciado nos países da Europa do Norte. Eu gostei bastante.

Parece uma piada mas ainda tentei encontrar nesse mel algum aroma ou sabor que me lembrasse a banana, mas nada feito, era uma grande miscelânea de sabores. Digo-o porque uma das florações onde mais encontrei e fotografei abelhas foi precisamente junto às enormes flores na extremidade dos cachos de bananas. Parecia que tentavam aceder ao interior para alguma espécie de nectários.
Só mais tarde, na Roça de S. João de Angolares, no Sul de S. Tomé, é que vi uma dessas enormes “flores” com uma bráctea levantada, expondo uma boa quantidade de flores minúsculas onde as abelhas colectavam o néctar.

Mas convenhamos que teria a sua graça, exibir um monofloral de banana… sobretudo na nossa “república”…

Noutra volta, agora pelo Norte da Ilha de S. Tomé, em Mucumbli, junto a Ponta Figo, conheci um italiano que aí se radicara há muitos anos, Tiziano Pisoni. Já fora apicultor em Itália onde deixou as abelhas a um sócio. Aqui pretende reiniciar a actividade, como complemento a outras actividades agro-turísticas. Não me soube dizer que subespécie das abelhas africanas povoava a ilha, mas caracterizou-as logo de muito agressivas, difíceis de trabalhar e não aceitavam as caixas de madeira com facilidade.

Tinha apenas duas colónias instaladas em colmeias Langstrooth e mais uns quantos enxames selvagens em árvores ocas. Contou que transferiu um enxame de uma árvore para uma colmeia mas as abelhas desertaram ao fim de pouco tempo. Entretanto houve outro enxame que entrou voluntariamente noutra caixa, mas as abelhas não aceitaram as ceras que trouxera da Europa, os alvéolos eram demasiado largos para o reduzido tamanho destes insectos e acabaram por construir os favos entre os quadros. Chegou a fazer testes para encontrar ácaros de varroa mas os resultados foram negativos.

Falou-me no mel escuro, muito húmido e na extrema dificuldade em conservá-lo, quase sempre acabava por fermentar. Não foi possível visitar o apiário pois chovia torrencialmente, mas mostrou-me umas quantas árvores e arbustos de interesse apícola que cultivava no jardim.

Ainda tentamos visitar um apicultor recolector que vivia nessa região, na Roça Ponta Figo, mas estava ausente na montanha conforme nos informaram, andava a crestar umas colónias que possuía para esses lados. Mesmo assim os vizinhos levaram-nos ao apiário perto de casa, onde havia duas ou três caixas de madeira pintadas de azul, assentes sobre um muro e que suponho que funcionariam como cortiços, sem quadros móveis.

Devo dizer que foi a reportagem apícola possível, num país onde a apicultura não existe, mas com muito potencial e oportunidades em que ajudas financeiras oportunas e sobretudo a formação de apicultores poderiam dar frutos a muito curto prazo.

Abelha solitária que inicialmente me pareceu do género Apis, nidificava em orifícios abertos na madeira.

Ninho de vespas extremamente agressivas e muito abundantes nas ilhas de S. Tomé. Recebiam aqui o carinhoso nome de Maria Miranda.

Uma vespa solitária.

Uns amigalhaços que sempre nos acompanharam nas praias do Ilhéu das Rolas.

Pico Caué ou Cão Grande, um dos monumentos naturais mais iconográficos no Sul de S. Tomé.

E para fechar a "chave de ouro", esta foi a primeira fotografia que a Luísa tirou mal chegamos a S. Tomé. Num país com tão boas relações com Portugal, onde a maior parte dos produtos encontrados no mercado são portugueses, logo o mel...

Um abraço e agradecimento especial:
Ao meu amigo e irmão Adlander Aragão, o mais experiente e exímio condutor de todo-o-terreno de S. Tomé. Cujas preferências musicais nos fizeram apreciar até à exaustão uma das músicas mais surrealistas que alguma vez ouvimos. Obrigado também pela magnifica festa do 44º aniversário que nos proporcionaram na praia junto ao Forte de S. Sebastião.

Ao Aurélio e ao Estevão Soares, guias do Parque Natural do Obô, pela maior colecção de plantas afrodisíacas que me mostraram, não para agora mas para um dia que delas necessite, claro está. Também pela alucinante corrida através de um trilho cheio de água, atravessando a selva desde a Lagoa Amélia e debaixo de uma tremenda tempestade tropical.

Ao Tiziano Pisoni, pela forma simpática com que nos recebeu na Quinta Mucumbli e connosco partilhou os seus conhecimentos de apicultura.

Ao ZeferianoGila” guia do Parque Natural do Obô na ilha do Princípe, infatigável na subida do Pico Papagaio que não chegamos a alcançar mas que muito valeu pelas bonitas paisagens e pelos apicultores que nos apresentou.

Ao Zé António e ao Zé Luís (Zé das Abelhas) pela partilha de conhecimentos e experiências com as abelhas e pela vontade manifestada em racionalizarem as respectivas actividades apícolas.

Ao Ílidio, segurança do Resort Pestana Equador, pelas colónias de abelhas selvagens que nos encontrou no Ilhéu das Rolas.