10 novembro, 2008

O meu primo apicultor no Séc. XIX

O Primo Martinho dos Lobos

Sempre lamentei não ter um antepassado apicultor. Muitas pessoas que eu conheço herdaram a arte dos pais ou avós e hoje dão-lhe continuidade. O meu pai ainda teve dois cortiços, gostava de ver as abelhas a chegar e a partir, mas era um amigo dele que crestava e fazia todas as tarefas.
Há pouco tempo, enquanto mexia nas velharias lá de casa, encontrei um livro escrito em 1942 pelo meu tio-bisavô, Jacinto José Moreira, que foi capitão do exército na I Guerra Mundial. No referido escrito “Memórias da Minha Terra”, relata inúmeras histórias e tradições sobre a Casa Branca no século XIX, onde encontrei o texto que aqui reproduzo e... já tenho um antepassado apicultor!!!

"O Primo Martinho dos Picões, mais conhecido pelo “Martinho dos Lobos”, por se dedicar à caça destas feras, era primo-co-irmão de minha mãe e tio do meu primo Marcolino Luiz, ainda vivo, felizmente, e que è proprietário do “Monte do Poço”. O primo Martinho, que era proprietário do “Monte” do Pego, onde resida, era um exímio caçador de lobos tendo conseguido, com esse seu género de desporto de ha mais de sessenta anos, um importante peculio. Abateu grande numero destas feras e por vezes lhes tirou as suas ninhadas, chegando defrontar as lobas nos seus covas – diziam – e a tirar-lhes as crias para o que, antecipadamente lhes introduzia o cano da espingarda na boca. Apresentava então aos lavradores, criadores de gado, os pequeninos lobos, andando para isso de “Monte” em “Monte”, dos quais recebia grandes remunerações. Diziam então que ele evitava, com o seu sistema de não querer matar as lobas-mães, com a mira de nos anos seguintes lhes poder tirar novas crias e viver assim daquele rude género de desporto.
Este homem, que à primeira vista alguém diria ser uma criatura desumana em virtude de se dedicar a tão rude profissão, que muitas vezes exercia com grave risco, tinha a sua afeição, muito dedicada, a outros animais.
Tinha grande criação de abelhas em numerosas silhas e então era curioso presenciar a maneira carinhosa como ele tratava estes insectos.
Quando notava que alguém lhe destruía algum destes utilissimos produtores do saboroso mel, todo ele se indignava.
Chegava às vezes em que, dizia ele, estes animais andavam cheios de frio, a apanha-los com a mão e a acariciá-los, chegando até a leva-los junto da lareira para os reanimar, dando-lhes a seguir a liberdade. Dizia ele que estes animais o conheciam e na verdade assim parecia, pois que nunca o picavam.
Faleceu jà de avançada idade na sua propriedade do “Monte” do Pego, já referido, no sítio do Almadafe, onde ha grande quantidade de “Montes” dispersos pertencentes à freguesia de Casa Branca."
In “Memórias da Minha Terra” de Jacinto Moreira


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